terça-feira, outubro 23, 2012

No cars go where we know.

Um dia, numa pequena praia do sul, aconteceu algo que poderia ter mudado a vida de todos para sempre. Mas, na verdade, mudou só para eles mesmos, já que não eram pessoas importantes e o que acontecia na vida deles não faria diferença para ninguém. Ela morava lá, ele apenas passava as férias. Ela não tinha cabelos e ele não podia enxergar. Ela poderia usar peruca, mas nunca sentiria a sensação de ter cabelos como parte de seu corpo. Ele nunca iria enxergar novamente. Apesar disso, nos seus sonhos isto era possível e aguardavam ansiosamente o dia em que iria tornar-se realidade. Afinal, sonhos na maioria das vezes são irracionais.
Nesse dia, eles se encontraram e resolveram se conhecer, quase sem querer. De repente o sonho dela passou a ser o dele e vice-versa. Passavam os dias juntos, ouvindo música, dançando, conversando. Às vezes, quando ela lia para ele, sentiam-se como se fossem parte do livro e ficavam imaginando como seria se as coisas fossem diferentes. Diziam que talvez um dia pudessem escrever um livro juntos, para que outras pessoas pudessem sentir o que sentiam. 
As pessoas passaram a dizer coisas como "lá vem a carequinha com o cegueta". Antes de se conhecerem, talvez isto pudesse magoá-los, mas naquele momento estavam muito ocupados com eles mesmos para se importar com qualquer outra coisa.
O verão chegava ao fim e estava na hora de despedirem-se, mas não fizeram nenhum tipo de promessa porque sabiam que não poderiam cumprir. Ao invés disso, criaram um lugar onde pudessem se encontrar quando estivessem longe. Lá, ela possuía lindos e longos cabelos negros e ele perfeitos olhos castanhos que não poderiam enxergar melhor.
Não havia carros, internet ou televisão. As pessoas passavam o tempo sendo elas mesmas, dando importância às verdadeiras coisas e apenas vivendo. Eles podiam viver em paz, fazer sexo aonde quisessem e amar do jeito que achassem melhor. Teriam vários animais correndo pela casa e mais tarde várias crianças. 
Não parecia muito real, mas funcionava para eles. Sempre que sentiam falta um do outro, visitavam esse lugar e, pelo menos por algum tempo, eram felizes.
E ele sabia que nunca poderia fazer com que ela tivesse cabelos. E ela sabia que nunca poderia lhe dar novos olhos. Mas ela o fazia enxergar um mundo melhor do que costumava conhecer, e ele a enxergava melhor do que o resto do mundo. E para eles isso era o suficiente.

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